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Incentivos à produção cultural no Brasil

31 de julho de 2019 - 16:36

*Artigo publicado originalmente na Revista Exibidor, edição JUL – SET 19.

Muito se fala no fomento à cultura no Brasil, em especial nas leis de incentivo fiscal no Brasil. Tem sido bastante comum ouvirmos opiniões prontas sobre a Lei do Audiovisual, a Lei Rouanet e outros mecanismos, parte desse debate realizado inclusive pelo próprio Presidente da República, o que popularizou o tema. Vamos tentar organizar aqui quais mecanismos existem para o fomento da atividade cultural e o que possa estar faltando.

São três as linhas de fomento à produção cultural existentes no país: fundos públicos (divididos aqui em dois tipos: os que apoiam a fundo perdido e os que participam da receita do produto financiado), incentivos fiscais (divididos aqui entre incentivos a marcas que investem na produção cultural e incentivos a agentes econômicos do mercado cultural, que investem e participam das receitas) e, por fim, os fundos de investimento na produção cultural (que oferecem ao investidor incentivo fiscal ou não).

A grande maioria dos instrumentos de fomento são federais, mas há também mecanismos de fundo e incentivo nos estados e munícipios. Para conhecer mais cada mecanismo, seus limites e funcionamento, publicamos uma brochura chamada Manual do Patrocinador, que está disponível gratuitamente na internet (www.manualdopatrocinador.com.br).

Toda a política desenvolvida nas últimas décadas no Brasil e os incentivos implementados a partir da Lei Rouanet e Lei do Audiovisual foram fundamentais para o desenvolvimento do segmento no país. De qualquer maneira, tais modelos são direcionados para investidores que são empresas brasileiras, especialmente, contribuintes no Brasil, que podem usufruir de incentivos que preveem redução de tributos ou suas bases (comumente IR e ICMS) e os valores dos fundos são liberados para os produtores desenvolverem e executarem os projetos, ou seja, os recursos são disponibilizados durante a produção.

Assim, sem esquecer do passado e dos importantes avanços, é tempo de olhar para novas políticas e modelos validados internacionalmente, pois, um tipo de estímulo que ainda não vimos desenvolvido no Brasil são aqueles focados na atração local de produções audiovisuais nacionais ou estrangeiras e que se comprometem com a entrega de incentivo após a execução da produção. Muito comuns no mundo todo, esses incentivos começaram no Canadá, sendo adotados posteriormente por muitos estados americanos. De maneira grosseira, eles se dividem em dois tipos: incentivo fiscal (tax credit) ou reembolso (rebate). O mais comum entre os dois é o reembolso.

O rebate oferece o reembolso ou devolução de um percentual dos gastos executados em produções audiovisuais realizadas na respectiva área de abrangência, em despesas previamente qualificadas, isto é, apontadas nos programas como despesas elegíveis a reembolso. O tax credit é um crédito tributário outorgado ao produtor, que pode ser usado pela própria empresa ou transferido a terceiros, que passa necessariamente pela conformidade com as normas de tributação.

Em ambos os casos, o reembolso ou o crédito fiscal é concedido após a demonstração da execução dos gastos mediante apresentação de notas e outros  documentos fiscais comprobatórios das despesas, assim como a partir de uma prestação de contas que demonstre o cumprimento das regras estabelecidas pelos programas de incentivo.

Cada um desses mecanismos – sejam rebates ou tax credits – são implementados a partir de um conjunto de critérios adotados pelo poder público concedente, conforme os indicadores econômicos que queira produzir, tais como: Valores mínimos e máximos de investimento na produção; Valores máximos de reembolso ou incentivo; Percentual mínimo de dias de execução da produção no país; Valores mínimos a serem gastos com despesas direcionadas ao elenco principal, diretor e roteirista; Valores mínimos a serem gastos com os salários da equipe de suporte e todos os demais custos de produção; Projetos apresentados por empresas com ou sem estabelecimento no país; Teste cultural para validação de que o projeto resultará em produção de imagem positiva do país; dentre outros critérios.

É interessante destacar que países como o Reino Unido e Austrália 1 têm recorrentemente apontado os benefícios auferidos com a implementação dos programas de incentivos, demonstrando que os gastos realizados com programas de incentivo geram desenvolvimento econômico e asseguram a arrecadação de tributos em volume superior aos gastos realizados. De acordo com o estudo Screen Business – How screen sector tax reliefs power economic growth across UK 2, publicado em 2018, foi demonstrado que a arrecadação nos segmentos que receberam incentivo cresceu substancialmente, “as receitas fiscais totais para os três setores que tiveram benefícios fiscais entre 2013 e 2016 cresceram 67%, de £ 1,11 bilhão para £ 1,86 bilhão durante este período de quatro anos”.

Retomando os dados sobre a realidade brasileira, o Brasil é apontado como um dos países que irá apresentar maior crescimento na esfera das indústrias criativas, com média superior à mundial, de acordo com estudo elaborado pela Pricewaterhouse Coopers (PWC, 2017) 3 , para os segmentos da mídia e entretenimento da economia criativa. A taxa de crescimento anual composta, prevista para tais segmentos no Brasil, é de 4,6% no período 2016-2021, ao passo que no resto do mundo, esse crescimento está previsto para alcançar cerca de 4,2%. Um estudo realizado pelo BNDES 4 também aponta que a expectativa é a de que o Brasil consiga gerar uma receita com entretenimento e mídia da ordem de US$ 43,7 bilhões e a taxa de crescimento anual estimada para o cinema no Brasil, de 2016 a 2021, é de 6,8% e para vídeo na internet em 8,8%.

Diante deste quadro, entendemos que é estratégica e oportuna a implementação de programas de reembolso ou concessão de créditos fiscais às produções audiovisuais, para a atração de investimentos estrangeiros e fomento à coprodução internacional, seja no âmbito do governo federal como nos estados e municípios. O desenvolvimento de programas deste tipo pode resultar em benefícios diretos e indiretos ao segmento audiovisual, tais como: atração de mais investimento para o setor; estímulo ao desenvolvimento tecnológico e de inovação; estímulo à capacitação de profissionais do segmento de audiovisual;  aumento de trabalho e contratação de pessoas físicas e jurídicas, que darão suporte ao desenvolvimento, produção e pós-produção; atração para o turismo e bem estar social.

Fabio de Sá Cesnik e Daniella Galvão.

1 Relatório – Impact of Film and TV Incentives in Australia – Olsberg•SPI – https://www.screenproducers.org.au/assets/Insights-images/Impact-of-Film-and-Television-Incentives-in-Australia-FINAL-2018-03-12.pdf (acessado 24/05/2019)
2 https://www.bfi.org.uk/sites/bfi.org.uk/files/downloads/screen-business-full-report-2018-10-08.pdf Estudo elaborado por Olsberg SPI e Nordicity, consultado em 24/05/2019
3 Perspectives from the Global Entertainment and Media Outlook 2017–2021 – https://www.pwc.com/gx/en/entertainment-media/pdf/outlook-2017-curtain-up.pdf (acessado em 24/05/2019)
4 Visão 2035: Brasil, país desenvolvido: agendas setoriais para alcance da meta / Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social ; Organizadores: Fernando Puga e Lavinia Barros de Castro. – 1. ed. – Rio de Janeiro : BNDES, 2018.

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