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A Twitch pode alterar o pagamento dos streamers?

20 de agosto de 2021 - 15:54

Em maio deste ano a plataforma de streaming Twitch, de propriedade da Amazon, anunciou o seu projeto global de redução do preço para inscritos. A mudança passou por diversos países até chegar ao Brasil no final de julho, mudando os pagamentos feitos a streamers para valores na moeda local e causando uma redução do preço. Anteriormente, o valor era de R$22,99; desde o final de julho, passou a ser de R$7,90, sofrendo, portanto, uma redução de 66%, uma das maiores porcentagens se comparado com outros países do mundo que também foram incluídos no projeto. 

O inscrito, também conhecido como “sub”, é a forma apresentada pela plataforma para que as pessoas que acompanham o criador de conteúdo consigam apoiá-lo financeiramente em troca de benefícios ao espectador, como a possibilidade de assistir às lives sem anúncios, criando assim uma comunidade.

A justificativa da plataforma para a mudança é tornar as subs mais acessíveis, de modo que as determinações dos valores passassem a ser adequadas para cada país e sua realidade, considerando o poder de compra do local e uma pesquisa com os criadores de conteúdo para verificar o valor ideal, segundo o Vice-Presidente de Monetização Mike Minton.

Segundo o executivo, os países que já implementaram a medida apresentaram resultados positivos, com um aumento no número de pessoas inscritas. O valor que o streamer perderia com a redução é compensado com um aumento da audiência. Para aplacar os ânimos, a plataforma também criou um programa de proteção de renda para os criadores de conteúdo durante esta fase de transição, em que a Twitch arcaria com a as diferenças durante o primeiro ano até que o aumento do número de inscritos possa reequilibrar a remuneração. Para o recebimento do auxílio, um dos deveres do criador de conteúdo e parceiro da Twitch é a realização continuada de 85% da média de lives realizada em seu canal.

Apesar de todo o cuidado, diversos streamers passaram a questionar publicamente a medida e outros métodos utilizados na hora do repasse. Foi criado um sindicato dos streamers, que divulgou um manifesto que já conta com mais de 2.500 assinaturas de streamers, que, juntos, têm mais de 13 milhões de seguidores. Há, inclusive, uma ameaça de “Apagão da Twitch”, em que, como forma de protesto contra a alegada falta de transparência da empresa, usuários da plataforma vão interromper a produção ou acesso de qualquer conteúdo na plataforma no dia 23 de agosto.

A relação estabelecida entre o criador de conteúdo e a plataforma é uma espécie de parceria em que ambos buscam atrair cada vez mais espectadores. Porém, não se trata de uma relação trabalhista comum com a presença de um superior e um subordinado. É uma relação puramente comercial de partilha de receitas geradas com assinaturas e cliques que não preenche os requisitos do vínculo trabalhista na legislação brasileira.

Nessa relação comercial, parte das receitas obtidas com as inscrições são repassadas aos streamers, sem os quais, evidentemente, as inscrições não teriam razão de ser. Fica evidente que a visibilidade que o streamer tem acerca da audiência, número de assinaturas, e mecanismos de auditoria para confirmar os valores a que faz jus é de suma importância.

A questão da transparência nas empresas tem cada vez mais sido ressaltada nas relações jurídicas nacionais e internacionais para que se torne possível a fiscalização dos trâmites internos, impedindo abusos.

A mudança das regras de repasse de maneira unilateral, ainda que acompanhada de medidas paliativas, gera uma sensação de insegurança entre os streamers, que acabam ficando, de alguma maneira, presos a plataformas que conseguem um “network effect” como a Twitch. É difícil, para um streamer, manter o nível de adesão fora desses centros de gravidade das redes como o Youtube e a Twitch.

Do ponto de vista jurídico, o streamer termina vinculado ao contrato que aceita no momento em que começa a gerar conteúdo, e ainda não se viu no Brasil a defesa de alguma tese que sustente uma natureza jurídica diversa dessa relação que pudesse dar ensejo à uma eventual obrigatoriedade de manutenção dos termos ou garantias mínimas.

Adriana Suzuki é estagiária do CQS/FV Advogados

Ygor Valerio é sócio do CQS/FV Advogados

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